Os programas econômicos dos candidatosComentários informaisPaulo Roberto de Almeida
(pralmeida@mac.com; www.pralmeida.org)
A partir de perguntas encaminhadas pelos comitês de campanha dos dois candidatos do segundo turno a jornalista de
O Globo.
Comentários de Paulo Roberto de Almeida: (PRA: )
1 - Planeja manter o princípio da responsabilidade fiscal? Qual será a meta de superávit primário? Como alcançá-la?
Lula: Vamos manter a responsabilidade fiscal com crescimento e melhoria da distribuição de renda. Manteremos a meta de superávit primário de cerca de 4,25% do Produto Interno Bruto (PIB) nos próximos quatro anos e aproveitaremos o crescimento mais acelerado da economia para promover a melhoria da qualidade do gasto público. Com o crescimento maior, o peso desse gasto será diluído. Os aumentos reais do valor do salário mínimo e as transferências de renda por meio da Previdência, LOAS e Bolsa Família serão mantidos. É preciso destacar ainda que o ajuste fiscal não se dará em detrimento dos investimentos em infra-estrutura, necessários para o desenvolvimento do país.
(PRA: Promessas generosas, mas insustentáveis em vista do atual, e futuro, quadro fiscal, que aponta para uma deterioração rápida das contas públicas. Para reduzir os juros, o superávit primário deveria na verdade ser aumentado, não mantido tal qual. Não diz como se vai alcançar crescimento mais rápido, se ele já não foi alcançado agora, num quadro internacional extremamente favorável, que pode não se manter no futuro. Ou seja, promete coisas absolutamente contraditórias ao mesmo tempo, quando o problema real é justamente o aumento irresponsável dos gastos públicos.)
Alckmin: Vou manter. O tamanho do estado brasileiro é desproporcionalmente grande. Apropria cerca de 45% do PIB. No ano passado, a receita corrente própria do governo alcançou 41,4% do PIB, a carga tributária alcançou 37,4% do PIB e outras receitas 4% do PIB. Como seus gastos superaram este total, o governo ainda tomou empréstimos (déficit público) de 3,4% do PIB, o que totaliza 44,8% do PIB. Portanto, a responsabilidade fiscal precisa ser reforçada, não só para começar a reduzir o tamanho do estado, mas também melhorando a sua eficiência e qualidade dos serviços públicos priorizando as despesas de acordo com a demanda da população. A meta de superávit primário será mantida. O ajuste fiscal precisa começar acabando com o desperdício e a corrupção, aumentando a eficiência e a produtividade, racionalizando a utilização de recursos, estabelecendo transparentemente objetivos e metas de cada unidade da administração pública, cobrando resultados e responsabilizando os gestores. Tais medidas foram implantadas no Governo Mario Covas e aprofundadas no meu governo no Estado de São Paulo. Uma vez feito este ajuste e implantado o princípio "o governo só pode gastar aquilo que arrecada" cabe um debate nacional amplo sobre se o tamanho do Estado brasileiro deve ser reduzido adicionalmente ou não. Se a sociedade demandar redução adicional no tamanho do estado serão necessárias reformas institucionais e, isto num país democrático é definido pela vontade popular.
(PRA: Começa fazendo um diagnóstico mais correto da situação e do peso verdadeiro do setor público. Na verdade, contando com efeitos indiretos da alta tributação e baixo nível dos serviços, os efeitos cumulativos do peso do Estado são ainda maiores, aproximando-se, provavelmente, de 55 a 60% do PIB. Cálculos de tributaristas indicam, aliás, que se todos pagassem os impostos devidos, a carga fiscal seria maior do que 60% do PIB. O candidato é cauteloso e não diz que o tamanho do Estado brasileiro DEVE ser reduzido, pois sabe que a população ainda tem ilusões quanto a um papel positivo do Estado, quando este tornou-se, de fato, atualmente, o principal entrave ao desenvolvimento brasileiro.)
2 - O câmbio flutuante será mantido? Que mecanismos utilizará para reduzir a apreciação do real frente ao dólar?
Lula: O sistema de câmbio flutuante será mantido. O governo também continuará realizando operações de compra de reservas cambiais para garantir um estoque de reservas capaz de reduzir cada vez mais a vulnerabilidade externa. A queda dos juros e o aumento das importações, proporcionada pelo crescimento maior e pela abertura da economia, diminuirão a pressão pela valorização cambial.
(PRA: A política do câmbio flutuante veio para ficar, isso parece claro, mas a melhor defesa contra a valorização do real não é a compra infinita de dólares, pois isso custa caro ao Tesouro e também sai caro manter reservas muito altas, pois elas são pessimamente remuneradas, e sim a existência de grandes fluxos de comércio exterior, nos dois sentidos. O governo mantém, pelos seus principais conselheiros econômicos, um viés mercantilista declarado, preferindo apenas exportar, em lugar de manter grandes correntes nos dois sentidos. Uma importação maior contribuiria largamente para desvalorizar o real e aumentar o valor do dólar, que é mantido baixo pelos altos fluxos de entrada, e pouca saída. O governo precisa deixar de ser mercantilista.)
Alckmin: No meu governo o regime de taxa de câmbio será mantido, mas aprimorado. Deve ficar claro que o atual regime tem gerado enormes volatilidades, instabilidades e crises e que o Banco Central tem intervindo fortemente e freqüentemente, seja vendendo dólares como na crise do Méxido em 1995, crise da Ásia 1997, crise da Rússia em 1998, crise do Brasil em 1999, Turquia/Argentina/11 de setembro em 2001, crise do Brasil em 2002, para isto reduzindo as reservas cambiais, tomando empréstimos do FMI e outros órgãos ou emitindo títulos públicos em moeda estrangeira, mas sempre respondendo a choques e crises vindos do exterior. Ou, mais recentemente, o Banco Central tem feito intervenções comprando dólar em função do enorme fluxo respondendo à altíssima taxa de juros fixada pelo próprio Banco Central. O meu governo propõe uma flutuação administrada, mas com objetivos claros e para antecipadamente evitar as crises e estabilizar a taxa de câmbio. O que tem que ser evitado é a criação de expectativa de valorização da taxa de câmbio, pois isto aumenta o retorno do especulador e é uma expectativa que se auto-realiza. Num regime de câmbio flexível administrado, com objetivo de ter uma taxa câmbio de equilíbro fundamental, o equilíbrio ou pequeno superávit na conta de transações correntes poderá ser alcançado e a dívida externa será declinante ou contida num nível prudente, conseqüentemente não haverá razões para a criação de expectativa de depreciação cambial e ataques especulativos. Neste sentido, a livre flutuação para baixo da taxa de cambio é problema, mas para cima não é. Se houver episódios atípicos e passageiros que levam à depreciação, existem instrumentos convencionais para evitar a volatilidade excessiva. Desta forma, a política cambial deve sempre evitar a apreciação sinalizando para o mercado esta decisão, tanto com intervenções do Banco Central como do Tesouro Nacional. A compra de dólares e sua esterilização é o mecanismo típico utilizado. O acúmulo de reservas cambiais não será problema se a taxa de juros interna for igual ou próxima a internacional. E é bom lembrar que somente nesta condição só será possível ter uma boa política cambial.
(PRA: Politica muito clara de administracao da taxa de câmbio, ou seja flutuação suja, mas tampouco diz que o meio mais fácil de desvalorizar a moeda é reduzindo a oferta de dólar via aumento das importações. Todo político brasileiro parece ter vergonha de importações.)
3 - O sistema de metas de inflação será mantido? Há previsão de incluir
metas de crescimento? Qual é o ponto de equilíbrio entre a inflação e a busca
de um crescimento mais acelerado?
Lula: O contexto histórico agora é outro. O objetivo não é mais reduzir a inflação, mas mantê-la baixa. Recebemos um governo com a inflação alta, desequilíbrios orçamentários e nas contas externas, alto desemprego e crescimento muito baixo. Contrariando as expectativas da oposição, conseguimos colocar a economia brasileira na rota do desenvolvimento sustentado. Temos, hoje, um conjunto de fatores positivos: crescimento econômico com inflação baixa e geração de empregos, expansão das exportações com ampliação do mercado interno, aumento do crédito e do investimento com redução constante da taxa de juros e do risco país. Essa combinação de fatores é inédita na história do Brasil. E nós estamos provando que é possível crescer com uma inflação baixa. Não fixamos metas de crescimento no programa, mas é possível perseguir um crescimento médio de pelo menos 5% ao ano a partir de 2007. Para chegar a isso, buscaremos uma elevação da taxa de investimento da economia dos cerca de 21% do PIB esperados este ano para 25% do PIB até 2010.
(PRA: Começa com uma mentira: a inflação só foi alta em 2002 justamente por causa do “risco PT”, que provocou a maior valorização do dólar em tempos de flutuação de que se tem notícia na história econômica brasileira. O desemprego foi menor do que o existente nos dois anos seguintes. O crescimento baixo continua, aliás exatamente igual. O desequilíbrio nas contas externas já vinha sendo revertido e os saldos superavitários seriam alcançados de qualquer forma. Todas as afirmações são feitas de má-fé e não se sustentam na realidade. Agora se valoriza a inflação baixa, mas TODOS os economistas do PT recomendavam uma taxa de inflação um pouco mais alta para sustentar uma taxa maior de crescimento e uma menor de desemprego. Foram inconsequentes e provavelmente aloprados. A taxa de investimento não tem nada a ver com o regime de metas de inflação, e sim com a capacidade “extratora” do Estado, hoje convertido em despoupador líquido e sanguessuga da poupança privada. Não diz como vai conseguir aumentar a taxa de investimento, aparentemente por vontade divina.)
Alckmin: O sistema de metas de inflação foi desenvolvido na Nova Zelândia num contexto de profunda reforma do estado na qual o objetivo era estabelecer um sistema de gestão pública por resultado com total transparência. Assim, os diversos órgãos de governo têm que publicar seus objetivos e metas, após negociação com o Parlamento, e apresentar relatórios periódicos de prestação de contas a população. Estes relatórios são auditados, avaliados e publicados por um órgão do Parlamento. Desta forma, é um sistema flexível que, de acordo com as circunstâncias, o sistema de metas pode e deve conter outras metas que não só o de inflação. Como de fato aconteceu na Nova Zelândia. Neste conceito, o sistema deve ser mantido, pois é mecanismo sistemático de praticar a democracia. O que chegou ao Brasil é uma corruptela e portanto demanda aperfeiçoamento. De fato, não há razões para que o Brasil tenha uma meta de inflação acima da média mundial, que está em torno de 4% ao ano, e isto estabelece o parâmetro central a ser perseguido pelo Banco Central. Da mesma forma, não há razões que determinem que o Brasil não pode crescer a uma taxa semelhante à média dos países emergentes, que está em torno de 6,8% ao ano, e deverá prevalecer nos próximos anos. Assim, ao invés de extrapolar o passado para o futuro e determinar que o produto potencial não crescerá mais do que 3%, ao ano, e assim praticar uma política de juros em que o produto efetivo fica enquadrado dentro deste limite absurdo, o meu governo parte do pressuposto de que o futuro deverá ser a expressão da vontade e competência da nação brasileira e a materialização das decisões e políticas do novo governo.
Mais do que isso temos um empresariado ativo e competente, técnicos e engenheiros com boa formação, trabalhadores disciplinados e dedicados e uma agropecuária e industria manufatureira competitiva que pode perfeitamente alcançar uma meta de crescimento igual a media dos países emergentes. É preciso, sim liberar estas forças e competências que estão reprimidas pelas altas taxas de juros, sufocadas pela tributação excessiva, penalizadas pela taxa de câmbio apreciada e espremidas pela voracidade do estado.
(PRA: Dá uma lição de história do regime de metas de inflação e não era isso que tinha sido pedido. Afirma, de modo totalmente gratuito, que “não há razões que determinem que o Brasil não pode crescer a uma taxa semelhante à média dos países emergentes”, quando existem, sim, boas – e más – razões para que o crescimento do Brasil seja pífio. O Brasil simplesmente NÃO PODE crescer mais do que o faz, por insuficiência de poupança, por magreza de investimento, por um péssimo ambiente de negócios, por ser ainda muito fechado, por uma qualidade pavorosa dos recursos humanos, por uma regulação intrusiva e um tributarismo claramente excessivo e exagerado. Quando esses GRANDES problemas forem resolvidos, ai o Brasil voltará a crescer. Do contrário, está condenado ao baixo crescimento e à estagnação da renda.)
4 - Como acelerar a queda das taxas de juros? Que medidas serão adotadas nesse sentido?
Lula: A inflação abaixo da meta abre espaço para uma queda mais acelerada dos juros. A situação econômica do país é segura e estamos convencidos de que ela vai melhorar cada vez mais. A política econômica bem-sucedida vai continuar, só que agora em uma nova fase: superados os desequilíbrios e controlada a inflação, estamos em condições de caminhar para uma taxa de crescimento mais vigorosa, continuando a baixar os juros.
(PRA: Isso, como explicação, é insuficiente, pois a taxa de juros é claramente influenciada pelo nível da dívida pública, que por sua vez é determinada por gastos em excesso de arrecadação. Uma política fiscal irresponsável não pode garantir uma política econômica bem sucedida.)
Alckmin: Do lado externo, com superávit em transações correntes e redução da dívida externa já existem fortes pressões para a queda na taxa de juros com a queda no risco Brasil. É o governo, com sua atual política, que sustenta, internamente, elevadas taxas de juros. Para quebrar a "convenção" de que taxas de juros mais baixas podem trazer instabilidade financeira é preciso um forte ajuste fiscal e, simultaneamente, um novo mix de política fiscal, cambial e monetária, que simultaneamente traga conciliação de interesses, garantia de estabilidade e delineie trajetória de crescimento sustentável e geração de emprego. No meu governo vou trilhar o melhor e mais seguro caminho para reduzir a taxa de juros que começa com ajuste fiscal, reduzindo a despesa corrente e o compromisso de governo com metas fiscais claramente definidas. O ajuste fiscal com meta de déficit nominal zero, por exemplo, implica que a dívida pública permaneceria constante e, portanto, declinante em relação do PIB. Com isso, estará criada também uma trajetória firme de queda na taxa de juros dos títulos públicos.
(PRA: Correto. Só não disse que o ajuste fiscal tem de ser feito via redução dos gastos do Estado, não via aumento dos tributos, como tem ocorrido até aqui. Enquanto isso não for dito claramente, só se pode concluir que os políticos são todos covardes, ao não assumir que o Estado é, hoje, o grande problema da economia brasileira.)
5 - Como o candidato se posiciona em relação à independência legal do
Banco Central? Pretende encaminhar projeto nesse sentido ao Congresso? Por
quê?
Lula: A autonomia do Banco Central é uma discussão que a sociedade brasileira ainda está amadurecendo. É por isso que o Senado Federal iniciou o debate, colhendo posições a favor e contra, para que se possa fazer a melhor opção para o país. Acreditamos que o ideal é que o tema seja tratado da maneira mais técnica e menos ideologizada possível.
(PRA: O governo é o principal responsável de o tema não estar sendo debatido com a sociedade. Adota uma posição de fato contrária, quando diz que a sociedade precisa examinar o problema. Os economistas esquizofrênicos do PT são todos contra, mas eles não acertaram nenhum diagnóstico e não fizeram nenhuma prescrição correta para a economia brasileira até hoje, porque dar-lhes crédito nessa matéria?)
Alckmin: Conforme resposta a questão 3 num país democrático como a Nova Zelândia a questão relevante não é a independência operacional formal do Banco Central. Em qualquer sociedade que pretenda ser democrática, os órgãos públicos devem estar sempre à serviço da sociedade e esta é que deve estabelecer os suas funções e seus objetivos que devem sempre refletir as preferência da sociedade, isto é, da maioria. Uma vez estabelecidos os objetivos, se for um órgão que envolve conhecimentos técnicos deve ter autonomia operacional. Mas na medida que se dá autonomia operacional deve existir como contrapartida mecanismos de responsabilização, de "accountability" e de transparência.
(PRA: Resposta totalmente ambígua. Ficou tergiversando. Precisava dizer apenas se era contra ou a favor. Parece que tem medo do debate.)
6 - As agências reguladoras serão mais independentes ou terão maior subordinação aos ministérios?
Lula: As agências reguladoras não podem decidir as políticas públicas. Elas regulam as políticas decididas pelo governo.
(PRA: Claramente insuficiente e passa por cima do papel relevante que devem ter essas agências na criação de um ambiente estável e favorável ao investimento privado. De fato, como se sabe, esse governo é contrário às agências e fez tudo o que estava ao seu alcance para sabotá-las. Só não fechou porque não tinha condições, do contrário voltaria ao regime promíscuo anterior, quando os ministérios eram balcão de negócios dos serviços públicos para fins claramente políticos e politiqueiros. O registro da ação do governo nessa área é deplorável.)
Alcmin: As agências reguladoras atuam onde a eficiência e justiça não podem ser alcançadas pelos mecanismos de mercado. Desta forma, as agências reguladoras devem atuar com regras claras e estáveis sempre visando estabelecer um equilíbrio econômico entre os interesse dos produtores e dos consumidores. Preço justo para os consumidores e regras claras e estáveis que garantam remuneração e reduzam o risco dos investidores são fundamentais para a expansão de setores como de utilidade pública. Neste sentido deve ter independência dos ministérios correspondentes.
(PRA: Também ambíguo, com exceção da última frase, que visa garantir a independência das agências. Deveria ter dito que vai reforçá-las e ampliar o número de agências despolitizadas. )
7 - Em relação às reformas da Previdência, Administrativa, Tributária,
Trabalhista e Sindical, qual será a ordem de prioridade?
Lula: A prioridade para 2007 é a reforma tributária. E não nos faltou vontade política para fazê-la neste governo. Ao contrário. Ninguém pode esquecer que, em abril de 2003, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi ao Congresso Nacional com 27 governadores para levar uma proposta de reforma tributária. A parte federal foi votada, mas a estadual, ainda não. No mês passado, fizemos novo esforço para tentar a aprovação - propusemos até a concessão de 1% a mais do Fundo de Participação dos Municípios. A oposição, porém, não quis votar. Acreditamos que, com a nova legislatura no Congresso Nacional e com os novos governadores, será possível aprovar essa reforma tão necessária para o país.
(PRA: Mentira, mais uma vez. Não foi só a oposição que não quis votar: todos os governadores, de situação ou de oposição, não quiseram perder a faculdade de fazer guerra fiscal. Tergiversa sobre o assunto e não expõe claramente que tipo e como pretende fazer com a reforma tributária. Tampouco aborda os outros assuntos, provavelmente porque não pretende mais fazer reforma nenhuma, por ser filosoficamente contrário às demais reformas.)
Alckmin: Com a sucessão de escândalos, inchaço e uso indevido da máquina administrativa, nós vamos herdar uma situação política, administrativa e orçamentária complicadas. Assim, as prioridades já foram definidas: reforma política e ações corretivas na área administrativa e orçamentária ganharam precedência. Com a casa minimamente em ordem será possível encaminhar as demais reformas.
(PRA: A reforma política é importante, mas não se conseguirá começar por ela, pois ela arrisca bloquear todas as demais reformas. Se deveria claramente colocar no mesmo pé de igualdade as reformas tributária e da previdência, e depois fazer a trabalhista e a administrativa, na suposição de que, no primeiro dia de governo, o novo presidente já terá enxugado a ministrança para não mais do 20 ministérios. Tem de dizer que sem reforma trabalhista, o desemprego não se reduzirá. Hoje o Brasil já é uma república sindical, inclusive patronal. Precisaria quebrar o sistema corporativo que engessa o Brasil.)
8 - O candidato planeja fazer ou não uma reforma da Previdência? Quais
os principais pontos? Introduzirá a idade mínima para aposentadoria? Desvinculará o salário mínimo do piso previdenciário?
Lula: Não há proposta de reforma da Previdência. Desde o início do governo, estamos realizando uma profunda reforma na gestão da Previdência Social. Fizemos a Reforma Previdenciária para o setor público. Reduzimos gastos e criamos mecanismos - como o recadastramento - para evitar fraudes, desvios e pagamentos indevidos. Recuperamos créditos e modernizamos os sistemas de arrecadação e fiscalização. O resultado é que, no início deste ano, a previsão de déficit era de R$ 50 bilhões, mas já foi reduzida para R$ 41 bilhões. Destacamos o Censo Previdenciário que realizamos e o ajuste no sistema de concessão de auxílio-doença. É preciso também buscar a eficiência da gestão, cujo ponto central, em nosso governo, tem sido a melhoria do atendimento aos beneficiários - que buscamos por meio da ampliação do horário de atendimento de 6 para 10 horas e do fortalecimento do atendimento a distância, por telefone e internet. O crescimento econômico trouxe e trará maior receita ao sistema e apostamos na redução da informalidade, com o projeto de lei em tramitação no Congresso que reduz as alíquotas para contribuintes individuais, incentivando o acesso ao sistema. Agora, com o crescimento mais acelerado da economia, será possível estabilizar, a médio prazo, o valor dos pagamentos previdenciários - que hoje estão em torno de 7,8% do PIB - como proporção do PIB.
Além disso, o Governo Lula considera um equívoco o pensamento de que a desvinculação entre o salário mínimo e o piso seja a solução para o problema da Previdência. Não podemos submeter os nossos aposentados e pensionistas a uma renda menor que o salário mínimo.
(PRA: O governo simplesmente não reconhece que uma das fontes do enorme problema fiscal que enfrenta tem origem na previdência. Eficiência de gestão para um sistema deformado significa preservas as raízes das iniquidades previdenciárias e não enfrentar o problema de frente, que é o desequilíbrio atuarial das contas, sobretudo as da previdência pública. Confia no crescimento para preservar um sistema iníquo e insustentável. Não tem coragem para enfrentar o problema de frente.)
Alckmin: Está no Plano de Governo que será necessário fazer uma reforma e mencionamos os principais pontos. Sabemos que a idade mínima de aposentadoria e a desvinculação dos benefícios previdenciários do salário mínimo estão na agenda de todos que se debruçam sobre a questão da reforma da previdência. Mas não se retiram direitos já adquiridos. Nós faremos uma reforma sem atropelos e com normas resultantes de amplo debate com a sociedade para desobstruir o futuro. Tentar tirar direitos ou forçar reforma numa direção pode não só inviabilizá-la gerando uma reação política tão forte que pode resultar num tiro no pé.
É preciso um amplo debate nacional, esclarecimento de todas as partes envolvidas e garantias para aqueles que se sentem ameaçados para que a questão tenha um bom encaminhamento e cheguemos a uma reforma que resolva as questões fiscais, que seja satisfatória para os trabalhadores e seja duradoura para as próximas gerações.
(PRA: Tampouco tem coragem de dizer que é preciso enfrentar as “espertezas adquiridas”, sobretudo no setor público. Afirma, pelo menos, quais os pontos que precisam ser corrigidos, mas existem vários outros que não são tocados. Quando se fala de “amplo debate nacional” é porque se exime de apresentar propostas claras e politicamente difíceis.)
9 - Planeja uma reforma tributária? De onde virão os recursos para compensar perdas de arrecadação? Em que tributos vai mexer? Do que pode abrir mão? A CPMF será mantida? Encaminhará proposta de renovação da DRU?
Lula: Como dissemos, é a reforma prioritária. Será centrada na simplificação e racionalização dos impostos, para ganhar aumentos de eficiência na arrecadação. Defendemos desoneração das exportações e dos investimentos. As perdas serão compensadas pela maior formalização da economia (recolhimento de tributos sobre os salários dos empregados com carteira assinada e sobre a receita das empresas). Essa reforma envolve articulação com os governadores, principais afetados por propostas como a transformação do ICMS num imposto de valor agregado e na simplificação das alíquotas.
(PRA: Vaguidão nas respostas. Não diz, por exemplo, que é preciso enfrentar o peso da máquina do Estado sobre a economia, as inconsistências previdenciárias, políticas setoriais que transferem renda para quem já é rico, e várias outras coisas mais que obstaculizam a redução dos gastos públicos, hoje claramente o fator mais relevante, nos três níveis da federação, que impede uma reforma redutora de tributos e não simplesmente “racionalizadora”, que é um conceito vago.)
Alckmin: Da mesma forma que na reforma da previdência social, não é possível forçar a aprovação de uma proposta pré-definida. A reforma será resultado de uma grande negociação, pois passa por questões muito complexas e delicadas politicamente como o da federação. O que é possível é estabelecer princípios que o meu governo adotará. Em primeiro lugar, não será uma reforma para aumentar a carga tributária como tem sido as reformas anteriores. Ao contrário, para estimular o crescimento e ganhar eficiência econômica, temos que desonerar o investimento produtivo, a produção e a folha de salários. Durante do meu período no governo de São Paulo, não aumentamos nenhuma alíquota de imposto, ao contrário reduzimos a alíquota de vários produtos. Para termos maior justiça social é preciso reduzir a participação de impostos indiretos que são muito regressivos no Brasil e aumentar a participação de impostos diretos que incidem de acordo com a capacidade de pagamento de cada indivíduo e, portanto, são mais justos e transparentes. Para reduzir os custos administrativos das empresas é preciso simplificar o sistema tributário. Para evitar distorções alocativas na economia é preciso privilegiar impostos com maior neutralidade como o imposto direto e imposto sobre o valor agregado.
(PRA: Correto, mas seria preciso dizer também que o imposto indireto precisaria ser federalizado, ter aliquota única e tendencialmente reduzida e que a folha de pagamentos precisaria ser absolutamente aliviada, com o fnal do sistema corporativo que beneficia também os sindicatos patronais. Seria preciso terminar com o imposto sindical e dar autonomia e independência aos sindicatos, acabando com a unicidade.)
10 - Fará uma reforma trabalhista? Quais os principais pontos propostos?
Lula: Não há propostas específicas de reforma trabalhista por parte do nosso governo. Nosso compromisso é retomar o debate sobre a reforma trabalhista, por meio do diálogo tripartite, a exemplo do que foi feito no primeiro mandato com a Reforma Sindical. Mas para que se avance nessa questão, é preciso encorajar os trabalhadores com o encaminhamento da Reforma Sindical no Congresso Nacional, que deverá estimular a negociação coletiva e a solução de conflitos. Quanto ao suposto impacto da reforma trabalhista na geração de emprego, relatórios da OIT e da OCDE mostram que não há na experiência internacional evidências empíricas de aumento do emprego decorrente da flexibilização de direitos trabalhistas. Mas não há dúvida de que a atualização das leis do trabalho pode contribuir para criar um ambiente mais propício à geração de emprego e à distribuição de renda, que a rigor dependem do volume e do ritmo de investimento e crescimento da economia. Acreditamos, no entanto, que há espaço para modernizar as relações de trabalho no Brasil sem precarizar os contratos de trabalho ou comprometer os direitos dos trabalhadores.
(PRA: O governo Lula é claramente refém da máquina sindical, que sob alguns aspectos é uma verdadeira máfia sindical. Existem evidências, sim, de que regras laborais mais flexíveis aumentam a empregabilidade: basta comparar as taxas de desemprego dos EUA e Reino Unido, em torno de 4%, com as do resto da Europa, na faixa dos 9% ou mais. Seria preciso, tão simplesmente, desconstitucionalizar e retirar da legislação a maior parte das regras laborais, deixando o grosso das normas para as negociações diretas e o contratualismo coletivo. Seria preciso, por outro lado, extinguir a Justiça do Trabalho, ela mesma geradora de conflitos e fonte de deformações no mercado de trabalho, quando não de corrupção organizada. Países normais não dispõem de justiça do trabalho e sim de sistema arbitral, complementado por varas especializadas na justiça comum para os casos mais complicados. Arbitragem sempre foi a melhor forma de resoluç ão de conflitos em quaisquer sistemas que exijam rapidez, transparência, clareza de propósitos e menor custo social.)
Alckmin: A reforma trabalhista deverá ter como foco a modernização da legislação trabalhista visando simplificar a contratação de trabalhadores. É preciso também uma legislação que incentive a formalização de 40 milhões de trabalhadores informais.
(PRA: Excessivamente vago e genérico. Tem medo de dizer que se trata de uma reforma essencial para aumentar o emprego. Sindicatos são feitos para garantir o emprego de quem já está incluído, não de quem precisa trabalhar.)
11 - Encaminhará projeto de reforma política? Defende as listas abertas, fechadas ou mistas?
Lula: O Brasil precisa fazer a reforma política com urgência. Ela é a mãe de todas as reformas. Nosso governo sempre teve consciência disso, embora a iniciativa e deliberação a respeito do assunto caibam ao Legislativo e não ao Executivo. De toda forma, tivemos que atender outras prioridades, como vocês sabem, porque recebemos um país praticamente quebrado. Agora, felizmente, já colocamos o Brasil nos eixos. Nossa democracia completou um ciclo muito importante, no qual todos os grandes partidos foram governo. Por isso, acreditamos que existam todas as possibilidades de aprovar uma reforma política e eleitoral. E temos certeza de que a grande maioria da sociedade sabe que é preciso mudar a estrutura política - com a fidelidade partidária, o financiamento público de campanhas e outras medidas - para corrigir desvios e combater ainda mais eficazmente a corrupção. A questão da forma de fazer é relevante, mas muito mais importante é não deixar passar essa oportunidade de realizar a reforma política e fortalecer a ética na política brasileira.
(PRA: Conversa mole, para não dizer o que prefere, e talvez não prefira nada, a não ser a preservação do sistema que aí está, que é um “presidencialismo de mensalão”. Trata-se, sem dúvida, da reforma mais importante, mas que pode paralisar todas as demais reformas se for lançado no início e na frente de todas as demais, Deveria ser deixada para os dois últimos anos do próximo governo e se começar pela tributária, previdenciária, trabalhista, administrativa, nessa ordem.
Alckmin: O meu compromisso é encaminhar ao Congresso Nacional uma proposta de reforma política já em janeiro, antes mesmo do início da nova legislatura. O ponto principal será a adoção da fidelidade partidária, que, somada à cláusula de barreira, que já começa a valer agora, vai garantir mais consistência à atuação dos partidos. Não defendo a adoção de listas. A nossa proposta prevê o sistema com voto distrital misto, que será um importante instrumento para reduzir os custos de campanha e aumentar a proximidade entre o povo e seus representantes. O sistema proporcional favorece a defesa de interesses corporativos, que, na maioria das vezes, são legítimos, mas, de modo geral, vão de encontro aos interesses coletivos.
(PRA: Pelo menos explicita suas propostas, mas erra ao arriscar comprometer todas as demais reformas pela reforma política, claramente a mais difícil de todas por envolver o interesse de parlamentares e regiões. Não diz absolutamente nada sobre a deformação da representação proporcional, do excesso de “representantes do povo”, que representam apenas a si mesmos, do excesso de gastos do Legislativo e não não fala tampouco a reforma do Judiciário que continua necessário pelo lado dos ritos e procedimentos.)
12- É a favor ou contra a reeleição presidencial? Planeja acabar com
ela ou manter? Se for acabar, planeja ampliar o prazo do mandato?
Lula: A reeleição é um retrocesso político para o Brasil. O mandato de cinco anos, sem reeleição, seria uma solução adequada para o nosso país. O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso vai carregar pelo resto da vida o gesto irresponsável de ter aprovado a reeleição em benefício próprio.
(PRA: Hipocrisia, ao não propor a sua extinção logo no primeiro mandato. Melhor seria ter introduzido regras mais claras para evitar abuso, como os que estão ocorrendo agora mesmo, com o uso da máquina pública pelo candidato no cargo.)
Alcmin: Sempre disse que essa não é uma questão programática, mas no que depender de mim, eu vou acabar com a reeleição. Hoje ela ocorre sem nenhum critério para quem disputa a eleição e permanece no cargo. Eu tive de deixar o governo de São Paulo seis meses antes das eleições, mas o meu adversário continuou no cargo. Veja o que foi feito esta semana, a primeira do segundo turno das eleições, o presidente Lula libera R$ 1,5 bilhão do Orçamento deste ano para beneficiar o candidato Lula. O valor é praticamente igual ao bloqueado pelo Ministério do Planejamento há menos de 15 dias. Isso é uso eleitoreiro de recursos públicos. Não dá mais para um país como o Brasil admitir que o governo federal adote práticas equivocadas com fins políticos. O presidente Lula transformou 17 ministros em cabos eleitorais do candidato Lula. O povo está cansado desse tipo de conduta, que apenas contribui para reduzir ainda mais o encanto do cidadão com a política. Atualmente, a reeleição não está regulamentada. Sem essa preocupação de reeleição, acho que poderei fazer um governo melhor que o atual, com uma equipe nova, com a legitimidade das urnas. O Brasil pode mais com um time novo.
(PRA: Correto.)
13 - Pretende avançar ou rever as privatizações? Em que setores há empresas
que poderiam ser privatizadas? Em caso negativo, planeja criar novas estatais, em que áreas acha importante o Estado estar mais presente?
Lula: Não haverá nenhuma privatização. Nosso governo está mostrando, com práticas bem-sucedidas, que a privatização de estatais não é a única maneira de garantir investimentos privados em projetos de infra-estrutura. Fizemos, por exemplo, excelentes parcerias entre empresas estatais e o capital privado no setor de energia. Na área de transportes, há o programa de concessões em andamento para a execução da Ferrovia Norte-Sul e para rodovias. Além disso, há o modelo de Parceria Pública Privada (PPP), que se inicia com as BRs 116 e 324. Nesse modelo, grupos privados realizam parte dos investimentos e o Governo entra com outra parcela, que é uma forma de reduzir o impacto dos custos dos pedágios para os usuários. Entendemos que o Estado tem a função importante de atuar como indutor do desenvolvimento. E contamos, para isso, com a participação indispensável dos recursos privados, principalmente nos projetos de infra-estrutura, que são fundamentais para dar suporte ao crescimento sustentável da economia brasileira.
(PRA: Claramente contrário às privatizações, e as PPPs são uma forma de privatização envergonhada, com a desvantagem de deixar o governo com os custos e a responsabilidade de remunerar o investidor privado, que pode fraudar os seus números, para receber dinheiro do governo. Melhor seria privatizar de vez.)
Alckmin: O programa de privatizações já foi implementado por governos anteriores. Não há nenhuma intenção de criar novas empresas estatais.
(PRA: Tem medo, vergonha ou pratica oportunismo político ao anunciar que o programa de privatizações já foi implementado. Existem estatais claramente ineficientes e monopolistas que merecem e deveriam ser privatizadas.)
14 - Planeja uma reforma sindical? Quais os principais pontos? Contará
com que apoios para realizá-las?
Lula: Nosso governo já encaminhou ao Congresso Nacional as propostas de Reforma Sindical aprovadas pelo Fórum Nacional do Trabalho. Cabe agora ao Legislativo definir e aprovar a nova legislação sindical brasileira.
(PRA: Se exime da responsabilidade, pois é claramente contrário quebrar o poder sindical que foi colocado sobre o Estado, como uma nova classe de prebendalistas, de rent-seekers, que sugam os recursos públicos. Se trata de um setor mafializado que mereceria ser totalmente revisto.)
Alckmin: No meu governo, todas as propostas de reformas terão um foco único: o desenvolvimento do país com garantia de manutenção de todos os direitos adquiridos. O Brasil precisa mudar para crescer e permitir que as empresas cresçam também e gerem empregos.
(PRA: Tergiversa sobre o assunto e não tem coragem de assumir o partido da sociedade contra as máfias sindicais, patronais e de trabalhadores, que assaltam o Estado e vivem às custas dee todos nós.)
15 - Quais os principais pontos de sua proposta para a área internacional?
Manterá o foco na integração regional e diversificação de relações? Planeja
insistir na vaga para o Brasil no Conselho de Segurança da ONU?
Lula: O Brasil continuará privilegiando o processo de integração sul-americana - o Mercosul e a Comunidade Sul-americana de Nações, em especial - e fortalecerá as relações Sul-Sul. Ao mesmo tempo, buscará ampliar seu acesso aos grandes mercados europeu, norte-americano e asiático e manterá com os países desenvolvidos um relacionamento positivo e soberano. A reforma do Conselho de Segurança é uma necessidade da democratização dos processos decisórios internacionais e dará maior legitimidade e eficácia à atuação daquele órgão. O Brasil, assim como a grande maioria dos membros das Nações Unidas, continuará empenhado nessa reforma.
(PRA: Nada a comentar: more of the same. Ou seja, continuará exatamente a mesma política externa, com todas as suas realizações. A reforma do CSNU, por exemplo, ao aumentar o número de vagas permanentes, não pode servir para democratizar o sistema e sim para dobrar o poder da oligarquia, apenas isso. Trata-se, de toda forma, de um tema que não foi debatido com a sociedade: não se sabe se ela aceita pagar mais para questões externas, quando os problemas internos são tão prementes.)
Alckmin: Vamos despolitizar as negociações comerciais e desideologizar a política externa. A estratégia de negociação comercial, sobretudo regional e bilateral, deverá ser modificada. Meu governo vai buscar a recomposição das relações do Brasil na América do Sul e a intensificação das relações com os centros mais dinâmicos da economia global, especialmente com a União Européia e os EUA, restabelecendo a prioridade das relações com os países desenvolvidos. Vamos criar iniciativas mais agressivas para melhor aproveitar as oportunidades de exportação para a China e defender, de forma mais eficiente, os setores industriais brasileiros ameaçados pela competição, nem sempre leal, das empresas chinesas. A assistência a brasileiros e a empresas brasileiras no exterior passará a ter efetiva prioridade nas atividades do Itamaraty.
A política externa deve ser vista como uma ação de Estado, dentro de uma perspectiva de médio e longo prazos, na qual o interesse nacional deve estar acima de visões conjunturais, ideológicas. A política externa do governo Lula se orienta por uma visão equivocada de mundo e se caracteriza por ser ideológica e partidária na sua execução, além de politizada nas negociações comercias. Pretendo restabelecer os princípios e valores tradicionais defendidos pelo Itamaraty ao longo de décadas.
É muito importante, também, que o Brasil se aproxime com passos medidos e seguros da OCDE ou ser acolhido num G-8, que poderia também incluir a China e a Índia.
(PRA: Poderia dizer, mais simplesmente, que voltaria para a política externa tradicional do Itamaraty, que nunca foi partidária ou ideológica)
16 - O governo brasileiro criou e liderou o G20, que termina 2006 sem
avanços. O que fazer diante deste fracasso?
Lula: Não houve fracasso. O G20 mudou completamente o perfil das negociações da rodada de Doha no âmbito da OMC. A partir do G20, os países emergentes passaram a ter papel fundamental nos debates da OMC. A prova disso é que na última reunião do G20, realizada no Rio de Janeiro, pediram para participar a União Européia, os Estados Unidos e o Japão, além do diretor da OMC, Pascal Lamy. O G20 colocou na ordem do dia o fim dos subsídios agrícolas dos países ricos. O termo "fracasso" para caracterizar a trajetória do G20 expressa uma atitude ideológica, marcada por uma visão submissa e conformista da ordem econômica mundial.
(PRA: Engano: o G20 não mudou o perfil das negociações, apenas impediu que naquele momento, em Cancun, em setembro de 2003, os americanos e europeus concertados fizessem uma grande maldade contra nós e os demais países exportadores não-subvencionistas. O papel do G20 está claramente exagerado, e sua ação só vale para uma parte pequena do dossiê agrícola, o protecionismo e o subvencionismo dos ricos, não os dos pobres. Nem todos os emergentes estão no G20, e no GATT-OMC as linhas de aliança são claramente ad hoc, não cabendo falar de blocos dos países emergentes e em desenvolvimento.)
Alckmin: O governo Lula errou ao basear toda sua estratégia de negociação comercial em ações multilaterais. Os entendimentos com a União Européia estão paralisados, o Mercosul em grave crise e o processo de integração hemisférico está praticamente morto. Em todos esses exemplos, o governo brasileiro ficou a reboque dos acontecimentos. Meu governo apoiará a retomada das negociações multilaterais da Rodada Doha. Vamos defender um acordo equilibrado, que represente um resultado satisfatório, tendo em mente a agenda para o desenvolvimento. A agricultura deve continuar a ser central nas deliberações. As concessões que forem eventualmente feitas devem ser avaliadas à luz das ofertas recebidas e dos nossos interesses ofensivos.
Vamos ampliar o relacionamento com os países de escala continental, como a China, a Rússia e a Índia, com base na reciprocidade de interesses, e não com a ilusão ideológica de que são aliados naturais em um eventual conflito de interesses com os EUA.
(PRA: Agricultura pode até ser central para o Brasil, mas não deveria ser o fator impeditivo de um acordo, pois se trata claramente do setor mais conflitivo e mais sujeito a regras especiais. Um coisa é certa: para voltar a crescer é preciso ter regras claras, inclusive para o investimento estrangeiro. Daí a necessidade de uma maior abertura econômico-financeira, e sobretudo comercial. )
17 - O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, anunciou um novo referendo
em 2007 para acabar com o limite de prazo para a reeleição presidencial,
o que possibilitaria a sua permanência no poder indefinidamente. Se isso acontecer, o candidato será contra ou a favor da manutenção do país no Mercosul (cláusula democrática diz que seus membros têm que ser democracias)?
Lula: O presidente Lula tem manifestado recorrentemente sua posição contra a reeleição, pelo menos consecutivamente, dos portadores de cargos executivos. A reeleição continuada de um governante, desde que respeitadas as normas do Estado de direito, não representa qualquer infração democrática. Esta hipótese existe em quase todas as democracias européias: na Alemanha ou no Reino Unido. Na França presidencialista também existe esta possibilidade de reeleição "indefinida". Quem pode, assim, decidir eleições ou reeleições são os eleitores. Por que esta fixação com a Venezuela?
(PRA: A fixação com a Venezuela está em que o presidente Lula manifestou, em diversas ocasiões, seu apreço pelo lider venezuelano: ele já esteve inúmeras vezes no Brasil e até decidiu onde deveria ser implementada uma nova refinaria da Petrobras. Isso é manifestação de poder, por parte da Venezuela, e renúncia à soberania, por parte do Brasil. Nosso Tribunal de Contas precisa aferir as contas de certas estatais, que estão sendo utilizadas partidariamente na política externa.)
Alckmin: A questão do referendo na Venezuela é um assunto interno, que deve ser discutido pela sociedade venezuelana. Agora, eu já me manifestei contrário à reeleição sem qualquer tipo de regulamentação. Parece não ser prudente. Como disse, vamos ampliar o relacionamento com todos os países da América do Sul, com base na reciprocidade de interesses e na defesa de nosso interesse. A Venezuela, o quarto maior exportador mundial de petróleo, acaba de entrar para o Mercosul. Isso será um grande desafio para o processo de integração. Sua entrada plena depende da ratificação do Protocolo de Adesão, que será examinado pelo Congresso Nacional somente no ano próximo. O fato de Hugo Chávez estar apoiando publicamente o presidente Lula - que claramente se mostra simpático a algumas das idéias que Chávez coloca em prática na Venezuela - não será obstáculo para tratarmos o relacionamento com esse país com base nos interesses da integração regional e dos interesses do Brasil.
(PRA: Contornou o problema e não respondeu à pergunta.)
18 - Vai manter o Bolsa Família? Com que formato?
Lula: Vamos manter e ampliar o Bolsa Família, que é um dos maiores e mais eficientes programas de transferência de renda do mundo e beneficia hoje mais de 11,1 milhões de famílias brasileiras. Em um segundo mandato, vamos aprofundar o papel do Bolsa Família como eixo integrador das ações de combate à pobreza e à desigualdade no Brasil. Ampliaremos a articulação do programa com ações de geração de trabalho e renda, de capacitação profissional, de alfabetização e aumento da escolaridade dos adultos beneficiários, de micro-crédito, entre outros. Assim, as famílias beneficiadas vão criando as condições para garantir o seu próprio sustento, deixando de depender do Bolsa Família. O governo buscará estratégias de acompanhamento individual das famílias beneficiadas que se encontram em situação de maior vulnerabilidade. Além disso, será aprofundada a relação com os programas do governo de apoio aos jovens, bem como com os estados e municípios que têm agenda de combate à fome e à pobreza que o Bolsa Família materializa em todo o país.
(PRA: O governo se orgulha do BF, quando na verdade deveria sentir vergonha pelo fato de tantas pessoas não conseguirem se inserir pelo emprego e pela renda e devam sua subsistência mínima ao governo, criando uma dependência que é nefasta.)
Alkmin: A minha decisão é de manter e melhorar o Bolsa Família, criado pelo PSDB no governo Fernando Henrique. O que o governo do PT fez foi mudar o nome de um programa que já existia. Temos que garantir transferência de renda, mas temos que oferecer condições especiais para a superação da pobreza. Estimular os mais pobres a viver de benefícios não é promover a inclusão, o que de fato queremos é dar dignidade, o que só pode ser feito com trabalho. O programa em curso tem muitos problemas, mas temos que superar um a um e melhorar para garantir a inclusão de fato dessa ampla fatia da população.
Quando falamos de aperfeiçoamento, estamos nos referindo, por exemplo, ao gerenciamento do programa. É preciso aprimorar o Cadastro Único Federal, integrá-lo aos cadastros dos programas de transferência de renda existentes nos estados e mesmo a outros programas existentes no âmbito federal, como o PETI (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil), o BPC (Benefício de Prestação Continuada) e mesmo a Previdência Rural. Também é preciso criar um sistema de monitoramento efetivo das contrapartidas das famílias. A família não vai sair da sua situação de vulnerabilidade com menos de R$ 100 por mês, mas tem chances de sair com seus filhos formados no ensino fundamental e no médio.
Do ponto de vista de política social, o Bolsa Família deve ser integrado às políticas de educação, saúde, capacitação profissional e de geração de trabalho e renda. É preciso também estudar a possibilidade de acompanhamento e monitoramento das famílias serem realizados pelos agentes comunitários de saúde. Hoje são mais de 180 mil deles em todo o Brasil. Eles estão perto das famílias, têm a confiança das mães e podem ajudar as famílias a atender as condições previstas no programa. Repito; a Bolsa Família será mantida e melhorada.
(PRA: Correto, apenas isto, e deveria ter dito que o objetivo último seria acabar com BFs e outras assistências públicas. Governo decente promove investimentos e crescimento do emprego, não fica distribuindo esmola.)
19 - Reajustará o salário mínimo acima da inflação? Qual será o percentual no primeiro ano do seu governo?
Lula: Vamos aumentar o salário mínimo acima da inflação para acelerar a distribuição de renda e estimular o mercado interno. É importante destacar que o salário mínimo teve aumento real acumulado de 26% até abril de 2006, e tem hoje o maior poder de compra dos últimos 26 anos.
(PRA: Salário mínimo nem deveria existir, pois ele representa um impedimento ao crescimento do emprego e ao equilíbrio das contas públicas. Existindo, não deveria ser nacional, e sim regional, ou estadual.)
Alckmin: Em princípio, uma boa referência para reajustar o salário mínimo de acordo com o aumento do PIB per capita, que é um indicador ainda que não preciso do aumento médio da produtividade. Desta forma, como a prioridade do meu governo é o crescimento mais acelerado do PIB o salário mínimo deverá crescer em termos reais. Entretanto, é preciso lembrar que os benefícios previdenciários estão vinculados ao salário mínimo, da mesma forma, a folha de salários de muitos estados e prefeituras, o que torna o reajuste do salário mínimo uma questão fiscal que tem grandes restrições como todos sabemos.
(PRA: Contorna o assunto e faz um pouco de magia econômica.)
20 - O que planeja em relação ao crédito consignado e habitacional? Manter? Ampliar? Como?
Lula: Nós realizamos uma verdadeira revolução no crédito, ampliando o acesso a setores da população que nunca tiveram essa chance. E fizemos isto combinando inflação baixa e melhorando o poder aquisitivo das classes mais pobres. Concretizamos mais de 17 milhões de operações de microcrédito, com taxa de juros máxima de 2%, num total de R$ 3 bilhões emprestados. O crédito consignado foi parte importante dessa política porque ampliou o crédito direto ao consumidor. Entre 2002 e 2005, foram R$ 220 bilhões a mais de crédito ofertado, sendo que, desse total, R$ 40 bilhões são de crédito consignado. O total de crédito na economia brasileira saltou de 24,2% do PIB em dezembro de 2002 para 32,4% em junho de 2006. Num segundo mandato, vamos continuar ampliando ainda mais a oferta de crédito e criando novas modalidades, como fizemos para o setor habitacional. Nossa meta é aumentar o volume de crédito para algo em torno de 50% do PIB.
(PRA: O crédito e o nível de juros poderiam evoluir positivamente se o governo operasse uma deconcentração no setor, promovendo nova abertura do sistema financeiro e bancário, com entrada de novos parceiros externos. Cartelizado como é hoje, o sistema só pode oferecer juros altos.)
Alckmin: No meu governo o ajuste e a política fiscal sólidos permitirão a queda na taxa de juros e com isso, o crédito ao consumidor e o crédito habitacional, devidamente dosados, serão instrumentos importantes de estímulo a ampliação da demanda e portanto de geração de empregos. Hoje pode se dizer que o trabalhador "paga por duas mercadorias e leva uma" quando compra no crediário, já que a taxa de juros ao consumidor é elevada. Portanto, vamos fazer todo o esforço para reduzir a taxa básica da economia e do crédito ao consumidor, o que resultará num significativo aumento do poder real de compra dos salários dos trabalhadores e ampliação do mercado, particularmente de bens de consumo duráveis.
(PRA: O diagnóstico é correto, ao dizer que o crediário é um roubo e uma fraude, quando se anuncia que se está vendendo “seis vezes sem juros”. Isso deveria ser coibido como propaganda enganosa. Não diz que a solução é terminar com o cartel das financeiras, abrindo totalmente o sistema à concorrrência e ao ingresso de novos ofertantes externos.)
21 -Tem planos de fazer um choque de gestão? O que isso significa? Cortar quantos ministérios? Cortar quantos DAS? O que mais?
Lula: É importante destacar que, no nosso governo, houve aumento do número de ministérios sem elevação do gasto com pessoal. Prova disso é que, em 2002, o gasto com pessoal e encargos representava 5,3% do PIB. Em 2006, esta proporção ficará em 5,1%, um percentual, portanto, menor do que o verificado no último ano do governo anterior, mesmo com o aumento no número de funcionários na ativa. Estamos produzindo mais com menos gastos, o que significa uma gestão cada vez mais eficiente. Em relação aos ministérios, eventuais modificações serão implantadas no início de um próximo mandato.
(PRA: O governo não diz que o investimento caiu para níveis irrisórios e que os gastos com pessoal são de toda forma exagerados. Se a gestão é eficiente, então se trata de outro país, que não o Brasil. Sobre o número de ministérios, a pergunta mais simples é a seguinte: quantas vezes por semana o presidente despacha com cada ministro? Não deveria haver mais de 19 ministérios, o número exato de edifícios ministeriais na Esplanada.)
Alkmin: O meu governo vai valorizar o servidor público. Em lugar de fazer o que o presidente Lula fez, levando para o serviço público pessoas cuja única credencial era ser amigo dele, eu vou prestigiar o funcionário concursado. Vamos fazer todos os concursos necessários para garantir qualidade no serviço público. Hoje, temos 50 mil cargos comissionados. Dá pra reduzir sem demitir ninguém. Aproveitar servidores de carreira nesses cargos. Vou reduzir o número de ministérios ao mínimo necessário para fazer o governo funcionar.
(PRA: Pelo menos diz que vai reduzir o número de ministérios ao mínimo necessário. Deveria anunciar logo que vai reduzir a no máximo 20, e de preferência 12 ou 15. Deveria também dizer que vai acabar com a estabilidade, um convite à preguiça e à incompetência.)
Fontes: Comissão de Programa de Governo da Coligação Lula de Novo com a Força do Povo
Comentários de
Paulo Roberto de Almeida
Brasília, 7 de outubro de 2006.